Palavras do diretor

A guerra contra o Paraguai (1864-1870) foi a maior tragédia do continente. Uma guerra total, em que os exércitos da Argentina, Brasil e Uruguai exterminaram mais da metade da população paraguaia, incluindo crianças que, com barbas pintadas de fuligem, mal conseguiam segurar o peso das armas. Para o Paraguai, essa guerra representou a destruição de sua nascente indústria nacional, de seu virtuoso sistema de educação pública e da distribuição equitativa das terras. Como afirmou o presidente argentino Mitre na época: "Na guerra do Paraguai, não apenas a Tríplice Aliança triunfou, mas também os princípios do livre-comércio".

A primeira imagem que surgiu para este filme foi a presença espectral do povo exterminado vagando pela selva. Acredito em fantasmas e penso que, além do túmulo, essas almas caminham pelos montes paraguaios, buscando a paz eterna ou o eterno desassossego. Sua salvação não depende de um Deus, mas da possibilidade de um encontro secreto entre as gerações passadas e a nossa.

Toda vez que visito a Comunidade Primeiro de Março, símbolo da resistência camponesa e cenário do nosso filme, sinto a força desse encontro. O impulso de uma tradição histórica que tentaram eliminar junto com sua população, mas que ressurge invencível em cada camponês e camponesa dispostos a lutar por sua terra. Por aquela terra que foi tomada do povo após o triunfo inimigo na guerra. Ali, o passado mítico e a possibilidade de um futuro diferente se encontram. Em uma época de tanta escuridão, queremos registrar cinematograficamente esse raio de luz que, atravessando o tempo, nos permite sonhar com um futuro melhor.